Na noite do dia 1º de novembro, por ocasião da X Semana do Escritor Pinhalense Edgard Cavalheiro, ocorreu um fato que marcou a história do Theatro Avenida e da cidade de Espírito Santo do Pinhal. Pela primeira vez, nos quase 100 anos desde sua inauguração, um indígena ocupou o palco do tradicional teatro pinhalense para proferir uma palestra.
Trata-se do indígena do povo Potiguara, João Irineu de França Neto, autor do livro “Diários na Aldeia – Escritos de um Indígena Potiguara”, lançado pela editora Folhas de Relva.
Em sua apresentação, João Irineu Potiguara foi além da palestra, apresentando danças, cantos, interpretação de trechos de seu livro e muito louvor à ancestralidade, transformando todo o Theatro Avenida em uma imensa aldeia sagrada em louvor à Mãe Terra, segundo os costumes dos Potiguaras.
Quer seja tocando seu violão e entoando uma canção típica de seu povo, tocando tambor ou empunhando o maracá (instrumento musical ritualístico indígena), João Irineu Potiguara em um tom sereno e pacífico fez a ligação de todos os presentes com suas raízes ancestrais, relembrando os primórdios dos reais habitantes destas terras brasileiras.
Além de sua apresentação individual, o indígena participou de um bate-papo mediado pelo jornalista e escritor pinhalense Alexandre Carrião Staut, sendo dada também oportunidade para que os presentes participassem com perguntas.
A apresentação do indígena pode ser assistida na íntegra através dos canais da Web Rádio Pinhal no Facebook e YouTube (digite na busca @wrpinhal) ou pelo site www.wrpinhal.com.br. 
O livro “Diários na Aldeia” pode ser adquirido através do site da Editora Folhas de Relva – www.editorafolhasderelva.com.br.

Pérolas de sabedoria
Toda a apresentação foi uma aula, dentro da qual se podem destacar trechos, tais como:
“Aprendi com minha avó o preparo de algumas plantas. Com ela aprendi que não poderia, por exemplo, cozinhar o alecrim, pois com isso toda a planta sofreria. Ela me ensinou que deveria preparar o alecrim abafado. Um tempo depois, dentro de meus estudos holísticos, descobri que isso se chamava infusão. Mas a infusão é algo que os indígenas sabiam há muito tempo e eu acho mais poético e bonito dizer como minha avó dizia: preparar abafado”.
“Na química, o farmacêutico retira da planta seus óleos essenciais, mistura uma determinada porção em álcool de cerais e produz o medicamento. A fitoterapia indígena é diferente. Certas plantas eu colho cantando, eu peço permissão para a planta ser colhida, peço a ela que entregue sua energia curativa para o feitio do remédio. Há folhas que colho no poder do sol, outros com a energia da lua. Com muito respeito pela Mãe Terra. E isso faz uma grande diferença”.

Sobre “Diários da Aldeia”
Obra surpreendente com as vivências do multiartista e xamã João Irineu França Neto, indígena do Nordeste do Brasil; um livro que pode (e deve) ser lido como um romance de auto-ficção. Nele, o autor explora temas como o amor e a sua natureza; vida e morte; a arte; e a natureza em si, sempre com uma reflexão importante sobre a preservação das culturas tradicionais do país, mas também sobre a preservação de todo o planeta.
O livro é organizado a partir dos deslocamentos do autor de sua aldeia de origem para a aldeia global, que também é sua casa e é nossa casa, sem deixar de lado a marcenaria literária. “Escrevo estas linhas em busca de uma escrita literária. O texto se assemelha a um diário cronístico, no qual situo o lugar de onde escrevo, principalmente de aldeias de meu povo indígena Potiguara, onde resido e trabalho, mas também de João Pessoa, onde também resido e trabalho, além de outros lugares de minha peregrinação da existência, que não são necessariamente aldeias. Entretanto, são lugares que fazem parte da grande aldeia planetária em que todos(as) nós vivemos - Pacha Mama, nossa Mãe Terra... Por isso, em todas as minhas andanças, crio relações fraternas e amistosas, simbolizando laços comunitários de aldeamentos múltiplos”, diz João Irineu.

Sobre o autor
João Irineu de França Neto é indígena Potiguara, Doutor em Linguística pela UFPB, Pós-doutor em Dialetologia pela Universidade de Lisboa, Pesquisador das Culturas Populares e Cultura Indígena, Psicólogo Clínico e Social, escritor, poeta, ator e xamã, fazedor de remédios fitoterápicos populares e de rituais indígenas. É professor de Linguística da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) na área de Linguagem, Cultura e Literatura Popular. Articula um trabalho de cinema comunitário na Comunidade Porto do Capim, em João Pessoa-PB.

Fotos: Tika Tiritili










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